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É psicólogo pela Universidade Nove de Julho e pós-graduando em Especialização em Terapia Comportamental e Cognitiva em instituto de Psiquiatria IPq -HCFMUSP. Convidado especialmente para falar sobre a cena que Ivana (Carol Duarte) se descobre trans gay.
A transexualidade está longe de ser um assunto de escolha ou de opção pessoal, afinal, ninguém de um momento para outro resolve mudar seu sexo. A transexualidade é uma condição que começa a se manifestar ainda na primeira infância, fazendo com que o indivíduo se identifique contrariamente ao sexo biológico.
Até o final de novembro de 2012, a transexualidade era considerada por médicos e psiquiatras um Transtorno de Identidade de Gênero, ou seja, uma psicopatologia pela qual pessoas Transexuais eram acometidas.
A partir de dezembro de 2012, o conselho diretor da Associação Psiquiátrica Americana (APA), atualizou seu Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, o DSM-5 – também conhecido como a Bíblia da Psiquiatria. Dentre as inúmeras mudanças feitas nessa atualização, no que diz respeito à questão de gênero realizadas pela APA foi a remoção do diagnóstico de “Transtorno de Identidade de Gênero” com sua substituição pelo diagnóstico de “Disforia de Gênero”.
Mas qual a diferença? A diferença é que a ciência chegou ao consenso de que as pessoas transexuais não sofriam com um “Transtorno”, palavra que traz consigo a ideia de uma doença mental, mas sim de uma “Disforia”, ou seja, um sofrimento emocional relacionado à incongruência entre sexo biológico e gênero.
Mas a pergunta que muitos se fazem é, se existem apenas os genes XX e XY, como a ciência explica o fato de alguém ser transexual?
Bom, apesar de não existir um terceiro sexo, nós aprendemos ainda no ensino fundamental que os cromossomos sexuais são fundamentais na diferenciação entre macho e fêmea. Contudo, estudos científicos como o trabalho “Sexo cerebral, um caminho a ser percorrido” de Durval Damiani, Daniel Damiani, Taísa M. Ribeiro e Nuarte Setian, propõem que não são apenas os órgãos genitais que diferenciam homens e mulheres, essa diferença também ocorre na morfologia cerebral.
Usando termos técnicos, nas mulheres, “o componente BNST (Núcleo da cama da estria terminal) e da área médio sagital da comissura anterior estão aumentados, o esplênio do corpo caloso é mais bulboso, o istmo do corpo caloso é maior e a massa intermédia está frequentemente ausente, quando comparado aos homens.
As mulheres mostram um corpo caloso diminuído em relação aos homens, mas a comissura anterior é 12% maior em mulheres, em homens homossexuais, do que em homens heterossexuais.
No entanto, quando a massa intermédia está presente nas mulheres, ela mostra-se maior do que em homens. Quando se estudam transexuais avaliando-se a quantidade de neurônios no BNST que expressam receptores de somastostina, nota-se que, a despeito da orientação sexual, os homens apresentam o dobro de neurônios expressando somatostatina.
Nos transexuais masculinos que optam pelo sexo feminino, o número é semelhante ao das mulheres, ao passo que nos transexuais femininos que optam pelo sexo masculino, o número é igual ao de homens.
Existem, portanto evidências cientificas de que a diferenciação sexual cerebral pode caminhar em sentido oposto à diferenciação genital.”
Mas o que esse estudo quer dizer? Esse estudo nos mostra que existem pessoas que nascem com um órgão sexual masculino e com um cérebro feminino, ou vice versa e por isso a pessoa afirma que está com o “corpo errado”.
Ao contrário do que muita gente pensa, ser transexual não necessariamente é ser homossexual. Essa questão causa muitas dúvidas em quem não está familiarizado com o universo das pessoas Transexuais. É comum a confusão de que ser um homem ou mulher transexual é, logo, ser homossexual. Mas gênero, que é a percepção individual de cada um sobre ser homem, mulher ou algo a mais, não é sinônimo de orientação sexual.
Ser uma pessoa transexual não significa necessariamente ser homossexual. Se for uma mulher trans e gostar de outra mulher, ela é lésbica, e se for mulher trans e gostar de homem, é heterossexual e por aí vai…
É claro que todas essas evidências precisam e estão sendo estudadas mais a fundo pela ciência, entretanto, elas nos dão base para afirmar que diferentemente do papel de gênero que é construído socialmente, ou seja, o fato de menino brincar de carrinho e menina brincar de boneca, o gênero, que nos dá essa percepção individual sobre ser homem ou mulher, pode estar ligado à questões biológicas da formação cerebral e por isso ele não é definido nem limitado apenas pelos cromossomos sexuais.
Embora a ciência ainda não tenha uma causa definida para a transexualidade, vale ressaltar a importância do respeito às diferenças, afinal, o segredo de viver em paz com todos consiste na arte de compreender cada um segundo a sua individualidade.
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